Nas duas últimas semanas submeti o meu dormente ser a duas provas de fogo: ver o O Ensaio Sobre a Cegueira e o Purificados de Sarah Kane.
Vamos por partes:
O ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA
Vai parecer um cliché mas a verdade é que adorei o filme. É de uma crueza e realidade indescritíveis: tenho 97,5% de certezas de que se uma epidemia deste género se começasse a alastrar pelo mundo, que o que se passa no filme ia de facto acontecer. O facto das personagens serem anónimas só nos facilita uma identificação, a encontrar pontos em comum que nos façam pensar 'eu podia ser assim.' Não só- é o facto da estupidez humana estar tão presente que nos desassossega e leva a pensar que existem pessoas assim algures (damn you[!!] Gael García Bernal, que tens um papel...).
Sofri, roí-me toda, vi partes do filme com o casaco a tapar os olhos porque não sabia se ia aguentar e no fim...sorri com as lágrimas nos olhos. Foram as celebrações altruístas (tantas que já vi, tantas das quais já fiz parte), foi o amor que se revelou, foi a chuva como chave de purificação que me fizeram aperceber que neste mundo andamos todos cegos: só vemos o que nos é posto à frente dos olhos (muitas vezes nem isso) e nunca olhamos em redor, não exploramos, não queremos saber mais - ou esquecemos o que está para trás ou vemos [tentamos ver] muito à frente.
Em terra de cegos quem tem olho é rei. Ela teve tudo para ser a rainha mas a pior dúvida possível ficou nela plantada.
Ninguém assistiu ao que ela gravou na memória: será que se esquecerão que um dia cegaram? Será que dá para cegar a memória?
Terá sido a cegueira um acto de Purificação? [já lá vamos]
Na semana passada...fui a MADAGÁSCAR! Fui DAMA, COISINHA PORCALHOTA e após rir até doer os maxilares, cheguei à conclusão que (para além do meu riso ser igualzinho ao da Glória) que onde quer que estejamos, não interessa o lugar desde que os teus amigos estejam lá contigo.
E chegamos ao dia de ontem:
PURIFICADOS
O meu primeiro pensamento após ter visto 30 minutos da peça foi: 'Catarina, tu mentaliza-te que o mundo em que vives já não é cor-de-rosa e esta peça é a prova viva disso mesmo.'
Já estava mais ou menos a par do trabalho da Sarah Kane, mas esta peça foi sem dúvida a epítome de toda a crueldade, frieza e [ir]realidade à qual possa alguma vez ter estado exposta na minha vida.
O monólogo inicial arrebatou-me: rendi-me aquela espécie de descrição de amor em que tanto vi o meu brilho dos olhos a replandecer em cada frase. Contudo, fiquei com imagens 'cruas' gravadas na mente: a peça tem um tom bastante intenso e não conseguimos escapar do ambiente sorumbático que nos impõe. Apesar de quando em vez sermos capazes de sorrir, eu quedei-me ao som dos gritos de dor que ecoavam e entoavam em mim. Adorei cada minuto da representação, cada pormenor que fazia com que a nossa imaginação possuisse naquela altura um certo 'overflow' de imagens ou de criação destas.
E ver aquela areia/cinza dourada cair em palco...foi um dos pormenores que mais me fascinou! Foi a passividade com que caía, o que levava a imaginar, a ouvir e a recriar...
E se a Cegueira foi um acto de purificação, aqui o acto de purificar era abrir os olhos e tentar escapar da realidade, porque fechá-los...Fechá-los era sucumbir ao mundo que nos apertava o respirar, que nos sorvia o fôlego.
Fenomenal.
[Eu cá continuo a digerir todos este factores que me mudaram tanto em duas semanas.]
1 comentário:
confesso, não fui ver o Madagáscar nem tenciono ir... mas fui ver o ensaio sobre a cegueira e isso já discutimos na aula da Castilho antes de ela chegar. a peça queria muito ter ido ver, mas o tempo foge por entre os dedos e parece que ultimamente ainda mais e logo foi-se a peça! e por essa não me perdoo.
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